14 de fevereiro de 2022

Espancamento e muito mais: conheça a batalha de Sheilla Souza, primeira jogadora transexual de futebol feminino no Brasil, natural de Biritinga-BA


"Na cabeça do meu pai, eu ia virar homem se jogasse futebol." A frase é de Sheilla Souza, de 31 anos, em entrevista exclusiva à ESPN para este 29 de janeiro, data que marca o Dia Nacional da Visibilidade Trans no Brasil, e explica como ela começou a se aventurar no mundo da bola totalmente a contragosto. Forçada.

Ao contrário do que se pode pensar, a primeira mulher transexual a jogar futebol feminino profissional no Brasil tinha pavor do esporte pelo qual hoje é apaixonada.

''Eu odiava jogar! Por eu ter um irmão homem e hétero, meu pai sempre pedia para eu ir para o campo com ele, porque ele já percebia que o meu jeito era completamente diferente do meu irmão. Ele tentava me empurrar para todas as atividades que meu irmão fazia. Na cabeça dele, eu iria virar homem se eu jogasse futebol. Então, ele me obrigava a ir para o campo e colocou isso na minha rotina. Eu comecei jogando com os meninos."Isto porque foi por meio do futebol que seu pai tentou de todo jeito fazer com que ela se sentisse alguém que ela não era.

''Quando eu fiz 16 anos, eu disse: ‘Não, eu aprendi a jogar bola, estou apaixonada por futebol, mas não me vejo nesse meio, no meio de homens. Eu ia na bola com medo de me machucar. Aí foi quando eu conheci um grupo de meninas que me chamaram para treinar com elas e eu fui. Eu comecei a treinar com elas, mas não podia disputar nenhum campeonato na região por não ter registro feminino e nem aparência tão feminina. Muitas mulheres diziam que eu era homem e que eu não podia jogar com elas porque a minha força era diferenciada'', contou a atleta.

Foi aos 16 anos que Sheilla percebeu que havia nascido dentro de um corpo 'estranho' e que a forma com que se olhava no espelho era bem diferente da que todos realmente a enxergavam.

‘’Eu sempre me via como uma pessoa bem feminina. A partir dos meus 16 anos, eu comecei a ter uma visão maior de mim e do meu corpo. Eu não sentia vontade de estar no corpo que eu tinha antes. Com os meus 16 anos, comecei o meu processo de transformação e só aos meus 21, quando eu fiquei responsável por mim mesma, é que eu comecei o período de transição'', detalhou a jogadora.

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Sheilla Souza relembra início e até ódio com o futebol: 'Na cabeça do meu pai eu ia virar homem se jogasse futebol'

Sheilla Souza, a primeira mulher trans a jogar futebol no Brasil, concedeu entrevista exclusiva à ESPN Brasil | Foto: Reprodução/Instagram @sheilla940

O Dia Nacional da Visibilidade Trans é celebrado anualmente no Brasil em 29 de janeiro porque foi neste dia, em 2004, que um grupo de ativistas transgêneros foi ao Congresso Nacional, em Brasília, pela primeira vez para um ato político em defesa da diversidade de identidade de gênero

Registro no cartório

Aos 21 anos, a atleta começou a transição com um tratamento hormonal acompanhada por um trio de profissionais da saúde: endocrinologista, psicólogo e psiquiatra.

Mas foi somente aos 26, após muita burocracia, que ela conseguiu mudar o seu nome no cartório para participar de competições. A partir dali, o antigo nome deixou de existir para a sociedade, que foi devidamente apresentada à atleta Sheilla. O sobrenome permaneceu o mesmo, Souza de Jesus, como forma de honrar sua família.

''Aqui na minha cidade [Biritinga, na Bahia], eu fui a primeira trans a conseguir um registro no cartório civil e o meu título de eleitora. Quando eu recebi uma mensagem da promotora do cartório, pediram a minha presença lá e ela me disse que meu nome tinha sido modificado. Foi uma surpresa para mim. Quando ela disse: 'Sheila, felizmente o seu registro saiu', eu fiquei muito emocionada'', relembrou.

Estreia como profissional

Com o nome registrado e com a dose de testosterona abaixo de 10 nanomols por litro de sangue, nível determinado pelo Comitê Olímpico Internacional (COI) desde 2015, Sheilla estava apta a ser inscrita em campeonatos profissionais femininos. Ela lembra que, mesmo assim, no início, alguns times reclamaram de sua participação.

Até que em outubro de 2020, depois de não passar em um teste para o Vitória e atuar em times amadores de Biritinga, cidade onde morava com seus pais, a jogadora recebeu o convite, através de suas redes sociais, para o primeiro clube profissional de sua carreira: o Desportiva Lusaca, de Camaçari (também na Bahia).

E foi em um amistoso no estádio de Pituaçu que Sheilla, até então lateral-direita [depois, acabou sendo goleira], tornou-se de fato a primeira mulher transexual a jogar futebol profissional feminino no Brasil. A notícia, no entanto, ganhou repercussão na internet e a jogadora foi alvo de preconceitos e xingamentos.

''Eu cheguei em casa e falei assim ‘professora, olha as mensagens transfóbicas que eu estou recebendo de homens que não têm conhecimento’. Eu digo isso porque são pessoas que realmente não têm conhecimento. Eu ouvi [algo] de um que me marcou: ‘Eu vou colocar uma peruca, silicone e vou mudar de nome para eu virar uma jogadora famosa, porque nunca vi homens jogarem no meio de mulheres''', detalhou.

Transfobia

Em meados de 2015, Sheilla resolveu dar uma pausa no futebol e foi morar com uma prima no Jardim Ângela, extremo da zona Sul de São Paulo. Lá, viveu o pior momento de toda a sua vida quando foi vítima de chutes e pontapés de um grupo de homens na rua.

''Eu tive um constrangimento. Passei por um momento muito ruim quando morei um ano e seis meses em São Paulo. Eu fui vítima de transfobia, vários homens me espancaram na rua de noite. Foi um momento muito ruim na minha vida. Isso nunca se apagou, mas hoje não me afeta mais psicologicamente. O que mais me afeta e me deixa triste é a questão familiar'', contou.


fonte: https://www.espn.com.br/futebol/artigo/_/id/9931218/lenda-manchester-united-sabe-quais-sao-responsaveis-por-tras-crise-comissao-tecnica-desrespeitosos

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